Nenhum dos gigantes da internet do mundo ocidental teve sucesso na China: Google, Amazon, Uber, eBay e Yahoo falharam na conquista pelo maior mercado digital do mundo. Este fenômeno contrasta com o sucesso que outras grandes corporações ocidentais atingiram em setores como automobilístico, bens de consumo, eletrônicos e serviços profissionais. Porém, as razões para o fracasso sistemático dos cinco gigantes na China vão muito além da óbvia dificuldade regulatória imposta pelo governo chinês.
Esta é a conclusão que Feng Li, diretor da cadeira de Information Management da City, University of London, propõe após extensa pesquisa e entrevistas com 225 líderes das principais empresas digitais do ocidente e seus concorrentes chineses. Categorizando os principais temas a partir das respostas obtidas, o pesquisador estruturou duas visões: interna, com as perspectivas dos líderes das empresas citadas acima; e externa, com as perspectivas dos líderes das empresas concorrentes chinesas, além de agentes da elite social, política e empresarial chinesa. Entender tal fenômeno serve não apenas para saciar a curiosidade dos interessados no assunto, como também fornecer insights importantes para aumentar a competitividade das empresas na era digital.
Os gigantes ocidentais falharam em entender e gerenciar um ambiente de negócios complexo, não adaptaram suas estratégias ao contexto de mercado local e não desenvolveram nem customizaram tecnologias e plataformas que atendessem às necessidades dos usuários chineses. Subestimaram a competição local e os desafios para dominar o maior mercado mundial de usuários de internet. Como se não bastasse, aportaram poucas vantagens genuinamente competitivas; na maioria das vezes, competiram com grande desvantagem, por mero descuido, arrogância e falta de paciência.
Especificamente, as conclusões de Feng Li podem ser estruturadas em três razões macro para o fracasso sistemático dos gigantes ocidentais da internet na China:
Falha em entender e responder ao ambiente de negócios chinês
Evidenciada pela falha em se adaptar ao ambiente regulatório, às relações governamentais e infraestruturas existentes; grande número de competidores agressivos e determinados; e falha em entender as diferenças fundamentais entre o mercado de internet e outros mercados tradicionais, nos quais histórias de sucesso de outras empresas ocidentais não puderam ser repetidas.
Concessão de múltiplas vantagens competitivas aos players chineses
Evidenciada pela tentativa de impor modelos de negócio globais na China, que requer alto grau de customização; problemas ao estabelecer parcerias locais e aquisições malsucedidas; e falha em estratégia de comunicação e inovação.
Ineficiência na operação e execução
Evidenciada pela falha ao impor plataforma tecnológica global, mas desconectada do contexto cultural e profissional do mercado chinês; centralização e lentidão na tomada de decisão, com pouca autonomia para os times locais, tentando gerenciar operações locais por “controle remoto” a partir das matrizes no ocidente; falha em “se inserir verdadeiramente” (be embedded) na China.
O fracasso retumbante de gigantes do ocidente no mercado digital Chinês tem consequências profundas que podem mudar o equilíbrio de poder tecnológico mais rápido do que imaginamos. Hoje, Alibaba transaciona mais produtos que a Amazon; o WeChat é maior e mais abrangente que Facebook, Facetime, Whatsapp, PayPal e LinkedIn, juntos. A China está à frente dos Estados Unidos e da Europa no campo de mobile payment.
O domínio chinês nos mercados digitais trará (ou já traz) desafios competitivos que podem se estender a praticamente todos os segmentos de negócios. É importante aprender com o erro dos gigantes ocidentais na China e tirar lições para a competição no futuro digital, que já começou.
Escrito por Clau Sganzerla – Vice-Presidente de Estratégia e Inovação do grupo Algar
Fonte: Época Negócios